quinta-feira, 9 de julho de 2020




Opinião
[texto publicado no Diário de Aveiro no dia 27mai20]


Assim Não!



PLATAFORMAcidades no Diário de Aveiro

Pompílio Souto (*)

Arquiteto; Urban Designer; ex-Docente Universitário




1.

Esta foi uma visita que não devia ter acontecido, porque a obra não devia estar a ser feita com um projeto que já não devia fixar soluções destas.
. Mais: - Do meu ponto de vista devia até ser possível "responsabilizar" quem, ainda hoje, promove, desenha, aprova, comparticipa e faz obras destas.

É que não é preciso ser grande ou pequeno seja lá no que for, para perceber a maldade de tudo isso.
Basta ser pessoa de bom senso que se preocupe, pelo menos um pouco, com o bem-estar e a segurança dos outros. Outros que vivem onde ela não vive e que usa espaços públicos que ela não usa: – Não usa nem neles faz vida.
Vida que inclua: ou os filhos a caminho da escola, da mercearia e da casa dos amigos, ou os avós a caminho do devaneio, do centro de saúde e do local d'encontro com os da sua idade, por exemplo.

. [- Mas que Exemplo!?]

E isto acontece na "nova Cidade a nascente" que o PDM agora nisso administrativamente a arvorou, sem nada de estruturante lhe acrescentar, diminuir ou sequer projetar, no sentido de que as "freguesias originariamente rurais" ganhassem os espaços, os equipamentos e a natureza – a qualidade e vida urbana – de que elas e o restante da Cidade, incluindo a consolidada, tanto precisam.

. [Isto é mesmo de quem nada percebe de processos de urbanização de territórios e espaços de génese rural – e do que isso pressupõe e implica]

É lamentável, eu sei, mas pior ainda é quando já todos vimos este filme, uma e outra vez, quase sempre com "a mesma escola de realizadores" e "a mesma passividade de espectadores" e sempre – mas sempre mesmo, meus Caros – com o mesmo resultado manhoso, frustrante e dispendioso para quem um dia o tenha de tornar seguro e aprazível.

. [É demais…eu sei; mas todos nós também temos alguma dose de "culpa" nisso]


2.

  

Como é que aquelas casas e aquela Igreja podem ter portas e adro a dar diretamente para a faixa de rodagem, daquela estrada?
Ou será o contrário: - Como é que se transforma uma "via pública" em "estrada" e depois se lhe "otimiza o piso" para "uso mecânico" e se "sinaliza" a sua "faixa de rodagem auto" na contiguidade de um adro de uma Igreja e da porta de a uma habitação?

. [É espantoso!]

Como é que alguém, que saia daquela Igreja ou que viva naquela casa, pode "pôr um pé na rua"? – Não pode!
Bem, primeiro "rua" não há, mas há uma outra "coisa", que em boa verdade também não sendo propriamente uma "estrada", pelos vistos permite que por lá se circule (como a foto documenta).
. E circula p.e o Presidente da Câmara – José Ribau Esteves – que num "tempo desconfinado", naquela hora, daquele dia e naquela remanseada visita às ditas "obras em curso no Dia da Cidade" saiu são e salvo.
. Num outro tempo – o corrente –, de um outro dia e hora circulariam, para além dele, o "trânsito" próprio da "coisa" – bicicletas, motorizadas e motos, bem como automóveis, carrinhas e camiões – e nesse outro contexto, qualquer peão só não correria o sério risco de ser atropelado por "especial deferência" de um dos utilizadores motorizados para quem a "via" está a ser, de facto, aprimorada.
. ["Haja deus! (que é o que pensarão os que saem da Igreja e, provavelmente, todos os demais – incluindo os não crentes…"]

Residentes e passantes, utilizadores daquela "coisa", como será que terão de "viver" com ela e, sobretudo, nela? Imagino que tenham de começar a substituir a gentileza de um "Viva: - Bom dia", por um angustiado: - "Viva!" - Que é o vocativo adequado aquele contexto.

3.

Impunha-se – como já por mais de uma vez se disse – uma "ideia e modelo de Cidade" para as freguesias a nascente da EN 109.
. Impunha-se a promoção de "centros e subcentros" e "unidades de vizinhança e bairros" estruturados em "quarteirões" nos quais as edificações têm traseiras e frentes, sendo sempre estas que conformam os "espaços públicos". Impunham-se "espaços públicos dedicados": ruas, avenidas e alamedas; largos, praças e terreiros; jardins, prados e bosques. Impunha-se a plurifuncionalidade inteligente, sustentável e amiga da geração de comunidades diversificadas mas coesas.

Entretanto façam lá, pelo menos, um Plano de Circulação e Trânsito. Que tenha como objetivo a movimentação, estadia e fruição de pessoas e veículos no espaço público, em segurança e com aprazibilidade.

. Que garanta "passeios" e "espaços para modos de circulação suave", e que, quando tal não for possível, se ponderem "sentidos únicos", e que, quando tal for inconivente, se opte por "espaços e planos de chão de movimento e tráfego partilhado".

. Não: - Não deve ser impossível, até porque a coisa já esta a ser feita nalguns espaços da Cidade consolidada.

Ora a outra Cidade a nascente, também merece e – por razões de segurança – isso lá até é mais urgente.
Eles e nós e todos os demais – agradecemos!


Fotos cedidas pelo Diário de Aveiro


Texto da responsabilidade de (*) Pompílio Souto, Coordenador da PLATAFORMAcidades; grupo de reflexão cívica | NOTA: Veja outros textos desta série no Blogue Plataforma Cidades || Contacte-nos: plataformacidades.op@gmail.com 

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