terça-feira, 31 de julho de 2007

A Nova Rede Escolar

voltamos, mais uma vez, às soluções atamancadas


Pronto, muito provavelmente vamos ter mais um conjunto de soluções atamancadas. Será sina nossa, ou será que, mais uma vez, vamos ter apenas aquilo que merecemos?
Com toda a franqueza, meus caros, eu estou mais nesta.

Refiro-me, desta vez, à questão da reorganização da nossa rede escolar do ensino básico, ao modo como antevejo que tal se fará e aos previsíveis resultados.
É certo que a estruturação de tal rede, a tipologia dos edifícios e espaços em que se apoiava, a respectiva localização e área de influência, bem como, as vocações que tinha(m) e os serviços que prestava(m), foram deixadas para trás nas nossas preocupações de modernização.
Herdamos – "num país desejavelmente rural e pouco letrado" – as escolas do "Programa dos Centenários". Escolas que separavam os meninos das meninas; que tinham uma só linguagem arquitectónica e variantes de imagem conforme o "típico" de cada região; cujos recreios de terra batida dispunham de (algumas) árvores e tinham associados um (pequeno) alpendre que funcionava com sua extensão e antecâmara da(s) sala(s) de aula. Estas eram espaços rectangulares segmentados ao nível do piso por um estrado: o do professor, do quadro e dos retratos dos timoneiros d'então, aqui.
Eram escolas que – independentemente de terem nascido "fruto do acaso e da necessidade" (*1) (ou talvez por isso mesmo) – estavam ao serviço de opções pedagógicas e didácticas que correspondiam a opções políticas claras (independentemente da sua bondade).
Em 1963, os "chatos" da OCDE lançam um "projecto de ajuda aos países mediterrânicos" (nos quais nos incluíamos): pretendia-se "harmonizar a concepção das construções escolares com as concepções de Escola e as orientações no campo da pedagogia (*1). Três anos depois surge entre nós a proposta dum projecto do qual destaco os princípios gerais que seguem:
"(...) (iii) a escola não se restringe à sala de aula e deve, por isso, estar aberta ao exterior; (iv) o ensino não consta só de memorização, mas é, também actividade que os espaços (diversificados) devem permitir; (v) deve ser fomentada a manipulação e criação de objectos (pelo que deve haver, ligada às salas, uma "zona de trabalho suja"); (...) (vii) nem todas as actividades podem ser realizadas no mesmo espaço (...); (viii) as refeições são actividades educativas (...), passando-se o mesmo com as instalações sanitárias (ix); (x) a escola é um edifício aberto, um equipamento social de e para toda a comunidade." (*1)
É longo o extracto, mas vale a pena: é que muito do que então – há 46 anos – se tinha por bom, sem qualquer discussão de fundo e negação de validade, ainda hoje não existe!
E o mesmo – o abandono de um projecto sem uma sua prévia avaliação – voltou a acontecer mais tarde (em fins dos anos 80) com as chamadas Escolas P3. Nisso pesaram a postura do (então) Ministro Veiga Simão, as decisões da Secretária de Estado Marília Raimundo e – sobretudo – o desempenho corporativista e retrógrado do Sindicato Democrático dos Professores e a contestação feroz da imprensa.

Agora, e ao que parece, escolas com menos de vinte alunos e com resultados académicos inferiores à média nacional vão ser encerradas. Meninas e meninos serão diariamente transportados e descarregados em super-escolas, que terão o quê? Mais de vinte alunos e resultados iguais ou melhores que a média nacional.
Salvo o devido respeito, parecem-me pré-requisitos (no mínimo) insuficientes e tenho a certeza que muito pouco discutidos.

Em Aveiro, o caso da Escola da Glória é paradigmático. Apesar de não ser uma "Escola dos Centenários", tem uma arquitectura (também) datada, dum tempo em que a segurança, a relação com o sol e a luz não era (assim tão) relevante; tem alunos a mais e espaços e pessoal a menos; à sua volta a cidade mudou e piorou-lhe o conforto e segurança, quer no acesso, quer na estadia; muitas das edificações do quarteirão onde se insere foram sendo demolidas ou desactivadas. Numa delas – a parte que resta do Convento das Carmelitas – agora vago, quer-se um Tribunal Administrativo; noutro – no ex-Quartel dos Bombeiros – ninguém sabe o que se quer; a sul – no terreiro donde por dois dias saíram os autocarros do Euro para o Estádio – medram ervas, às portas (encerradas) dum recreio e duma escola que (dum modo ou de outro) vai participar no processo de reorganização da nossa rede escolar do ensino básico.
A nova Câmara herdou uma "estratégia" (?), enquanto os Alunos, Pais, Professores e Funcionário herdaram o desconhecimento (quase absoluto) do que está em causa, do que se prevê, porquê, para quê e como.
Com a comunidade escolar (e o envolvimento da outra), com os especialistas (da Universidade de Aveiro, p.e.), faça-se a nível local o que deve ser feito. Afinal vocês – novos Autarcas em Aveiro – prometeram "diálogo": que tal seja feito à volta da Escola e não do Tribunal, meus caros.

(*1), de José Pacheco, in «www.eb1-ponte-n1.rcts.pt»