sexta-feira, 21 de setembro de 2007

o Abrigo e o Ofício

Abrigo de Autocarros junto à entrada da Escola João Afonso de Aveiro, em Aveiro

a história d'uma irresponsabilidades; até um dia, espero eu...

1)
Há cerca de um ano – roubando tempo aos meus tempos, dinheiro aos meus dinheiros e paciência à minha falta dela –, fiz um reduzido levantamento das "inseguranças" na escola onde era representante de pais e encarregados de educação.
Eram, tanto quanto me lembro, três os casos que retinha e que considerava exemplares da necessidade de uma ponderação mais vasta e cuidada sobre a matéria.
2)
Assim municiado lá comecei a "saga" de fazer chegar esta "carta a garcia", ou seja: expor à autarquia – neste caso à Câmara de Aveiro – as referidas situações e a dita necessidade.
Não me "passei"...porque já de lá venho, mas o facto é que: (i) para conseguir ser atendido pela "secretária de intermediação" foi um calvário em perdas de tempo e dinheiro; (ii) para explicar o que pretendia, não foi fácil; (iii) para agendar a reunião, a custo, num "buraco", lá se arranjou um "tempinho".
A receber-me estavam, finalmente, não menos do que um Vereador e um Engenheiro Civil. Como sabiam ao que ia, já tinham com eles alguma informação – supostamente preciosa – relativa ao que entretanto tinham feito para resolver os problemas que eu tinha identificado. Já tinham, por exemplo, enviado um "ofício" a quem de direito para que o abrigo de autocarros (que interrompia por completo o passeio) fosse substituído por um outro que não tivesse as obstrutivas protecções laterais, disse – realizado –, o Engenheiro.
O Vereador – baixote, de queixo em riste e olhar firme sobre a praça, onde – à falta de massas inspiradoras – se fixava no José Estêvão, estabelece enfaticamente:
– É isso mesmo; o "ofício" já seguiu: está feito, meu caro.

Sinto-me tolhido: o que é que "está feito"? Será a coisa ou serei eu. A coisa de facto não merecia, outra coisa, claro! Mas eu? Eu porquê? Porque mais não merecia depois de um tal "atrevimento", dir-se-á. E ele, ele que dirá?

– Este é o Lugar da Politica e do Poder; o Local, obviamente, meu caro! Diz, peremptório, agora de costas, em contraluz, confundindo a sua, com a figura verde bronze do "velho" José Estêvão.
Ainda bem que assim é, pensará, no final de contas, somos os paladinos regionais da "causa ferroviária".
Um o primeiro – Deputado da nação – trouxe a Estação dos caminhos-de-ferro para Aveiro. O outro, o segundo (?), não, ele, o Vereador da situação, trouxe... a dúvida e a discussão sobre o TGV e, de raspão (já que tinha a mão na massa), elucubrações várias, profundas e muito únicas sobre a Ota e outros casos da mesma natureza e dimensão: é obra! É-o, mas não de um q.q. modesto "abrigo de autocarros"; era o que faltava!
3)
Assim – e talvez por isso – indiferente a tudo, o Abrigo ainda hoje lá está! Volvido cerca de um ano sobre tão pronta, decidida e decisiva decisão – a de lhe "amandar" com um "ofício" –, resiste e matem-se empurrando os "irrelevantes" transeuntes, para fora do passeio.
É perigoso? Claro que o é: por ali passam INEMs a caminho dos hospitais. É incómodo, obviamente: desde então são já milhares os que descem, torcem e sobem à passagem pelo sítio.
Mas que importa tudo isso? O "ofício" foi mandado e Engenheiro, Vereador e Outros, continuam – melífluos, na bondade dos propósitos; absortos, no narcisismo das posturas e indiferentes, na irrelevância eleitoral do facto.
4)
É pequena a coisa, dir-se-á; mas eu não estou de acordo: pequenas coisas destas em grandes se tornam, por vezes (longe vá o agoiro), e de irresponsabilidades deste tipo se faz a paz do dia-a-dia duns poucos, pagos pelo denodo esforçado de muitos outros; até um dia, espero eu...
(Crónica publicada no JN Norte, em 19SET07)

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

O Interior e as Cidades [2]

Vista de Aveiro, "Centro"


o que falta é "avisar a malta" de que faz falta "uma lei de solos sensata e rigorosa e legislação capaz de pôr ordem nas mais-valias do imobiliário"



1)
Retomando o tema da crónica anterior – centrada no editorial do Público (*1) que alarmava, "estabelecendo": "o Governo desistiu do interior"; agora, a sua "prioridade são as cidades" – sublinhemos, mais uma vez, que o que o Governo fez – e bem – foi "mudar de paradigma analítico e modelo de intervenção."
Disso resultaram muitas e importantes coisas; não todas, nem algumas das que mais interessaria que resultassem; mas, enfim, reconheçamos que – mesmo assim – é decisivo que tenha decido " (i) inverter a correlação que o planeamento físico tradicionalmente estabelece entre "qualificação de território(s)" & "benefício da(s) pessoa(s)", colocando esta(s) em primeiro lugar e "programando" aquele(s) em função das necessidades e aspirações desta(s)".

Referia-se – nessa outra crónica – que o editorial em causa tinha uma segunda parte centrada nas questões das cidades. Vejamos, então, esse outro conteúdo.

2)
(...) "a preocupação que o estado actual das cidades merece ao Governo revela sensatez e atenção": (...) é nas cidades que vive a maioria dos portugueses", (...) é ai que "germinam os dinamismos económicos e os factores da competitividade e da inovação", sendo esse o caso (das redes) de cidades médias (...) "Braga, Aveiro, Leiria ou Viseu", p.e.
"Complicada" – e "constituindo um perigo" – é a "suburbanização" em "Lisboa e principalmente, no Porto". "A actividade predatória da construção civil e a gula das autarquias promovendo o inchaço das periferias fizeram ruir a vitalidade dos centros. Nos anos 90 Lisboa e Porto perderam mais população do que os municípios do interior."
Para resolver este "desafio", diz o editorialista, "já se deram passos importantes, como a revisão dos impostos municipais sobre imóveis ou a criação de sociedades de reabilitação. Mas falta uma lei de solos sensata e rigorosa e legislação capaz de pôr ordem nas mais-valias do imobiliário."

Assim é escrito, e eu subscrevo a quase totalidade disso mesmo; assim não é, no entanto, relativamente ao definir como "predatória" a "actividade da construção civil" e ao assumir como bondosos – na aplicação – os (novos) "impostos municipais sobre imóveis"; igualmente não subscrevo a "omissão de referência às responsabilidades, quer "dos políticos nos ditos anos 90", quer dos técnicos (e de quem os forma e acompanha), nos "desastres" que – repetidamente –, se reclamam sobre e estado das nossas cidades e território.

3)
Ora, a propósito disso: (i) não consta que haja muitos técnicos a queixar-se da não adopção, alteração ou simples desconsideração dos estudos, projectos e planos que fazem, dentro ou fora – ou dentro&fora... – da administração pública; (ii) vêm-se pouquíssimas vez "escolas"a intervir e a responder a este tipo de problemas e as "ordens" – a minha. p.e. – está muito mais preocupada com... olhem, sabem que mais, de facto não sei bem com o quê: - Oh, Roseta, vai p´rá... Portela! (iii) quanto aos políticos dos anos 90... ora, eu agora sei lá bem quem foram! (iv) relativamente aos "impostos municipais sobre imóveis", a sua aplicação tem sido – urbanisticamente falando –, criminosa, induzindo mais e mais ocupação urbana periférica; (vi) e como quase sempre acontece – desde que nos esqueçamos que doutro modo quase todos viveriam ao relento – restam os repetidamente "super maus da fita": os construtores civis e a sua "vocação predatória": é obra... É obra, mas licenciada, meu caros!
Assim, deste jeito descuidado, superficial e redutor se "faz o branqueamento de acções e omissões" nefastas e se "fazem as cabeças dos incautos", para que continuem a perorar pelo que não é tão relevante assim. Haja dó.

(*1), de 20AGO07, de Manuel Carvalho



(Crónica publicada no JN Norte, em 05SET07)