quinta-feira, 9 de julho de 2020



Opinião
[texto publicado no Diário de Aveiro no dia 10JUN20]


nem tudo será discricionário, mas lá que parece, parece…!



PLATAFORMAcidades no Diário de Aveiro

Pompílio Souto (*)

Arquiteto; Urban Designer; ex-Docente Universitário








   Bem, as intervenientes são de facto as mesmas mas não os protagonistas – o que para os otimistas será, em princípio, melhor.
  O objeto da coisa agora é outro – se bem que da mesma natureza – mas com uma localização agora menos central; ou será que não? 

   Parece haver pressa – outra vez; supõem-na compreensível: há dinheiro – e à vista (pelos vistos) e disponível, acham eles.

Estranhar-se-ia, talvez, o encavalitar de investimentos e de obras e de parceiros (#1) lá, por onde agora se fazem os deste "ramo". Mas estranhezas autênticas já serão poucas (há quem se vá habituando…), sendo óbvio, no entanto que muito haveria de ser explicado e, já agora, demonstrado.

Mas coisa importante, dirão os otimistas, desta vez o "negócio" não foi a altas horas da noite, (#2) nem num sábado: - Mas num Sábado porquê?

Vejamos então o que o poderá ter justificado:
– Sendo o "sábado o dia de descanso dos judeus", essa foi uma condição que manifestamente que os protagonistas d'então desconsideraram... trabalhando (e muito)!,
 Mas, por outro lado, e dado que o "sábado também é o dia do deus romano d'abundância e d'agricultura", isso já pode ter contado para os interessados - seria propiciador de um bom "negócio":
- Eram abundantes os dinheiros envolvidos e tudo, de facto, "deu em batatas" (para não ser indecoroso).

(#1), Nalguns casos espertamente abúlicos, como se verá mais adiante e no futuro, temo eu...
(#2), foi, de facto assim que a Câmara "vendeu" as Piscinas ao Beira Mar, que horas depois este as revendeu por um montante muitíssimo superior aquele que havia "prometido pagar" à Autarquia pelo mesmo bem...;  enfim: ainda é nisto que nos "embrulhamos" 

O ATUAL ESTADO DA COISA

 
Piscina que foi ou é do Beira Mar, ou doutrem – que todos ajudámos a pagar – e que no Centro da Cidade continua encerrada desde 2009 e é assim que ainda está no dia 8 de junho de 2020.
É Obra!


1)

Segundo o Diário de Aveiro está em curso, na envolvente do Estádio Municipal de Aveiro, um conjunto de investimentos da Associação de Futebol (AFA – FPF) e da Câmara Municipal (CMA).

. À conta da AFA-FPF, ter-se-á no sítio, uma Aldeia do Futebol com dois Campos de jogos, um Pavilhão, a Sede da Associação e Outros Equipamentos de Apoio.

. À conta da CMA, ter-se-á, também por aí, um Complexo Desportivo que incluirá a Academia do Beira Mar – com quatro Campos de jogos, Bancadas, Sede do Clube e Outros Equipamentos de Apoio. No Parque de Estacionamento do Estádio (que se terá descoberto agora excessivo (?)) vai-se construir uma Piscina e um Pavilhão Municipais preparados para eventos de escala nacional e internacional.

. À nossa conta indiretamente está, obviamente, grande parte de tudo isso.


Não sei qual é o valor total do investimento; sei, no entanto que o da CMA rondará os 5 milhões de euros.
Desconheço também qual é o custo de manutenção de tudo isto e a sustentabilidade da operação.

Sei, por outro lado, que para a zona – e incluindo ou não tudo isto – existe o PDA (Parque Desportivo de Aveiro) que é uma parceria entre a CMA e a Visabeira SA, à qual a primeira, em tempos, concedeu maioria à segunda.

Ora, enquanto a CMA já terá investido nesta parceria 15 milhões, a Visabeira diz que o desenvolvimento da operação que inclui quase tudo e mais alguma coisa (Hotel; Habitação; Campos de Ténis; Campos de Golf; Centro Hípico e que vai até ao Vouga…), aguarda que sejam comprados mais alguns terrenos, coisa que a CMA confirma.


2)

Eu confesso não ter coragem para estar contra tudo isto. Mais: – Eu até acho que algumas destas coisas podem ser bem-vindas, não sei se agora, se assim, mas mais seguramente de um outro modo e… um dia.

Mas o que me causa espécie é não serem conhecidos os programas, os projetos e os estudos económico-financeiros de cada coisa e do conjunto, bem como a sustentabilidade, não apenas ambiental, de tudo isso.
. É que, pelo menos a ambiental, ao que parece, ainda não está garantida.

Causa-me espécie, também – desculpem lá – ver os privados, com a Visabeira à cabeça – ou impávidos, ou a reclamar direitos e mais dinheiro pelo que alienem.
Então e as benfeitoras e acréscimos de valor, não contam; ou será que estão a ser calculadas para virmos – todos nós os investidores maioritários – a receber uma parte dos benefícios privados que o nosso "carcanhol" ajudará a que venham a existir?

Causa-me espécie, finalmente, essa coisa de uma entidade pública (a CMA, neste caso) "entregar" um bem por si constituído (um Complexo Desportivo) a outra – seja privada, ou pública ou o que quer que seja (o Beira Mar, neste caso).
.   Mas estou certo de que isso será apenas um "lapso de linguagem ou de escrita" e não um lapso de uma outra natureza qualquer.

Finalmente, defendo convicta e sustentadamente, três coisas:
– Um "outro modelo e modo de fazer cidade",
- Um "outro modelo e modo de a governar" e
- Um "outro modelo e modo de relação com coletividades, associações e afins".
É que nem tudo será discricionário, mas lá que parece ser, parece.

Nem tudo está mal; governa a maioria democraticamente eleita, que aparenta contar ainda com muitos apoiantes: - Mas isso não é tudo, nem chega para legitimar competências não diretamente escrutináveis pelo voto.

E é por isso que há democracias mais e menos avançadas.


3)

Aveiro tem todas as condições para ser uma cidade de bairros, unidades de vizinhança e freguesias, com diferentes especificidades mas fortes relações e complementaridades.

. A génese de muito disso está no território, no espaço de que dispomos e no conhecimento e saber com os quais formos capazes de os reconfigurar e de lhes suscitar a vida desejável.
. Vida menos desigual, sob tetos e em espaços públicos mais qualificados, com o trabalho, a escola e a unidade de saúde por perto.
. Claro que teremos, também, de ter coisas para todos: os transportes, os hospitais, as unidades empresariais, os pavilhões, os estádios e (no nosso caso) os portos.

Mas sejamos realistas e prudentes. Até parece que nada de novo, de imprevisto e de avassalador se passou recentemente – nem no planeta, nem por aqui em Aveiro.

Sim precisamos de postos de trabalho: - Olhem, com 5 milhões poderíamos fazer cerca de 130 T2, por exemplo e com os 15 milhões 360…

Existem [em Portugal] quase 26 mil famílias e 31 526 casas sem condições habitacionais mínimas admissíveis (*1)

Não sei quantas haverá em Aveiro, mas para além dessas muitas outras nos faltam:
– Todos o reconhecemos e por isso, a isso voltarei.


(*1), A Habitação Apoiada em Portugal; Ricardo Costa Alvarez – FFMS 2020


Texto da responsabilidade de (*) Pompílio Souto, Coordenador da PLATAFORMAcidades; grupo de reflexão cívica | NOTA: Veja outros textos desta série no Blogue Plataforma Cidades || Contacte-nos: plataformacidades.op@gmail.com 

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